ARTIGO: O bairrismo dos gaúchos e o teatro em Porto Alegre por Leandro Nunes

ARTIGO: O bairrismo dos gaúchos e o teatro em Porto Alegre

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http://ratoletrado.wordpress.com/2014/11/10/artigo-o-bairrismo-dos-gauchos-e-o-teatro-em-porto-alegre/#more-1335
Foto: Divulgação
Por Leandro Nunes
“Os gaúchos são bairristas!”. Eis é a frase do ano.
Diante do recente episódio no qual a torcedora gremista foi flagrada gritando “Ma-ca-co!” para o goleiro Aranha, do Santos, os debates sobre preconceito e xenofobia e a exploração da imagem da jovem tomaram conta dos canais e cadernos esportivos no País. Para tanto, a origem desses conflitos podem dar pistas e remontar algumas explicações há uns 150 anos, e que pode justificar, ou não, a cultura de preconceito que incita o Brasil como inimigo do Rio Grande do Sul, e vice-versa.
A frase no início do texto vem à mente, de alguma forma, quando um brasileiro visita o Sul do País. Porto Alegre escolheu manter viva e reviver sua memória, seja por meio dos monumentos nas ruas, no chimarrão, nas bandeiras espalhadas ou no engrandecimento de figuras importantes na história, como políticos e artistas. Este último pode ocorrer por meio da produção de reportagens históricas, exposições de fotografias e documentos, e a preservação de locais importantes, como se dá na Casa de Cultura Mário Quintana, que resguarda o local da antiga moradia do escritor e ainda reserva um espaço especial de arquivo histórico da cantora Elis Regina. Ainda que seja algo necessário e importante de se realizar, dada a importância das figuras e a potência de suas obras, esses espaços parecem marcar presença intelectualmente na vida dos gaúchos, muito mais em uma comparação rasa com a cidade de São Paulo, por exemplo.
Mas não é para defendê-los que o RA-TO-LE-TRA-DO escreve. É necessário resgatar alguma parte da História que ajude a explicar o que acontece entre nós. E mais uma vez, é preciso reconhecer, os gaúchos sabem fazer isso muito bem. Na lista de exemplos, está presente o trabalho do Ubando Grupo e seu primeiro espetáculo. Desde janeiro a cia segue em cartaz com a montagemHoje Sou Hum, Amanhã Outro, do poeta, jornalista e dramaturgo (gaúcho) José Joaquim Campos Leão (1829-1883), autodenominado Qorpo Santo.
O texto remonta o período da Guerra do Paraguai (1864-1870) que rendeu ao país mais de 300 mil mortos, além da destruição e embargos econômicos. Do outro lado do campo de batalha, brasileiros, argentinos e uruguaios perderam mais de 50% das tropas, além de civis. Na montagem farsesca, o grupo apresenta um rei inseguro que está temeroso por conspirações dentro de seu governo. Ironicamente, a majestade é enganada pelo seu próprio ministro. Dentro do jogo político, o tal ministro compreende que não precisa derrubar o rei, mas posicioná-lo convenientemente. Funciona como um realpolitik praticado por um mestre de natureza camaleônica.
Como resultado satisfatório, tudo muda, para que nada mude. O preço é pago em sangue, e os vencedores entoam cantos ao ritmo da música “Show das Poderosas”. Para justificar tantas perdas é preciso calar os que restaram. A solução? Elencar-se “profeta” e conceder pequenos poderes aos sobreviventes. Diga-se que há um tanto de bairrismo nos pequenos poderes. Exemplos nacionais de juízes que não admitem multas por se sentirem acima das leis ou empresários que transferem infrações de trânsito para amigos que não dirigem são rotineiros. Isso acontece no Sul, no Sudeste e no Brasil inteiro. Assim, o grupo revive no passado da obra de Qorpo Santo, o presente das nossas discussões. E não diz respeito ao quanto macacos e gremistas são diferentes, ou que corintianos são bandidos e são paulinos viados, os “invólucros de espíritos”, mas o quanto dói se reconhecer igual. Dói e mata.
Quanto ao uso pejorativo da palavra “bairrista”, eu trocaria por algo mais elogioso e necessário aos nossos dias: Monomania histórica.

Serviço:
“Hoje Sou Hum, Amanhã Outro”
Quando: Sexta, sábados e domingos, às 20h. Até 23 de novembro.
Onde: Teatro de Arena
Av. Borges de Medeiros, 835 – Porto Alegre – RS
Tel.: (51) 3226 – 02042
http://www.teatrodearena.com
Ingressos: R$ 20

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